Condômino inadimplente não pode ser impedido de usar áreas comuns do prédio
O
morador que esteja com as mensalidades do condomínio em atraso não pode
ser impedido de usar as áreas comuns do prédio, como piscina,
brinquedoteca, salão de festas ou elevadores.
O
entendimento foi adotado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de
Justiça (STJ) ao dar provimento ao recurso de uma proprietária de
apartamento que estava impedida de usar as áreas comuns do condomínio
por causa do não pagamento das cotas condominiais.
Por
unanimidade, o colegiado considerou inválida a regra do regulamento
interno que impedia o uso das áreas comuns em razão de inadimplência das
taxas.
No
caso discutido no recurso, a dívida acumulada era de R$ 290 mil em
2012, quando a condômina entrou com ação para poder utilizar as áreas
comuns após ter sido proibida pelo condomínio.
Ela
alegou que a inadimplência ocorreu devido a uma situação trágica, pois
ficou impossibilitada de arcar com as despesas depois que seu marido foi
vítima de latrocínio. Além disso, afirmou que já há duas ações de
cobrança em andamento, nas quais foram penhorados imóveis em valor
superior à dívida.
O
pedido foi julgado improcedente em primeira instância – decisão mantida
pelo Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP), que entendeu que a
utilização de serviços não essenciais sem contraprestação seria um
incentivo à inadimplência.
Controvérsia
Em 2016, a Terceira Turma do STJ, ao julgar um caso semelhante, decidiu no
mesmo sentido, declarando a impossibilidade de regras regimentais
restringirem o acesso às áreas comuns em caso de não pagamento de taxas
condominiais.
O
relator do recurso especial analisado pela Quarta Turma, ministro Luis
Felipe Salomão, destacou o ineditismo da questão no colegiado, lembrando
que a doutrina tem posições divergentes quanto à possibilidade de
restrição do uso de áreas comuns em caso de inadimplência.
Salomão
disse que o Código Civil estabeleceu como característica a mescla da
propriedade individual com a copropriedade sobre as partes comuns,
perfazendo uma unidade orgânica e indissolúvel.
O ministro destacou a regra do inciso II do artigo 1.335 do Código Civil – clara, segundo ele, na garantia do uso das áreas comuns como um direito do condômino.
“Além
do direito a usufruir e gozar de sua unidade autônoma, têm os
condôminos o direito de usar e gozar das partes comuns, desde que não
venham a embaraçar nem excluir a utilização dos demais”, afirmou o
relator.
Segundo
o ministro, o condomínio não pode impor sanções que não estejam
previstas em lei para constranger o devedor ao pagamento do débito. Ele
disse que “não há dúvidas de que a inadimplência dos recorrentes vem
gerando prejuízos ao condomínio”, mas que o próprio Código Civil
estabeleceu meios legais “específicos e rígidos” para a cobrança de
dívidas, “sem qualquer forma de constrangimento à dignidade do condômino
e demais moradores”.
Sem previsão legal
O relator concordou com um dos argumentos da recorrente, de que o parágrafo 1º do
artigo 1.336 do CC/2002 é claro quanto às penalidades a que está
sujeito o condômino inadimplente, e entre elas não está a proibição de
utilização das áreas comuns.
Salomão
disse que o Código Civil, ao dispor sobre direitos dos condôminos,
quando quis restringir ou condicionar algum desses direitos em razão da
falta de pagamento o fez de forma expressa.
“E
como é sabido, por uma questão de hermenêutica jurídica: as normas que
restringem direitos devem ser interpretadas restritivamente, não
comportando exegese ampliativa.”
O
ministro ressaltou que a falta de pagamento das taxas condominiais vem
sendo desestimulada em razão da possibilidade de perda do imóvel, por
ser exceção expressa à impenhorabilidade do bem de família.